domingo, 25 de março de 2012

Rotina de uma cidade pacata


A rotina em Frei Paulo de minha infância nunca foi massacrante, pelo contrario era muito interessante graças aos personagens incríveis que povoavam o pequeno e amado torrão. O carteiro Azael tinha um jeito interessante de andar, ele morava na praça da matriz, era pai de Virgílio, Joselito e Magali, andava por toda cidade, como se estivesse caminhando sobre um muro, e ao chegar às casas gritava: “Correio” Outro personagem interessante era Djalma, era muito bom ver esse homem conversar, era muito ilustrado e às vezes numa mesa no Bar de Dario ele reunia os amigos para divertidas conversas e piadas inteligentes. Djalma trabalhava no Fórum, mas sua maior habilidade ficava por conta dos discursos que fazia nos enterros. Enterro sem os discursos de Djalma não tinha a menor graça. Ele causava emoção e choro , ao logo dos anos desenvolveu essa habilidade de elogiar de forma desbragada a quem estava passando dessa pra uma melhor. Muita gente ia aos enterros só para ouvir Djalma falar. Ele também tinha várias filhas, eram moças muito bonitas, ele por sua vez era um pai zeloso e ciumento. Já o vi botando pra correr um rapaz de Itabaiana que estava namorando uma de suas filhas. Um jeep transitava vagarosamente pelas ruas e praças fazendo propagandas num alto-falante. era o ex-deputado Djalma Lobo que sempre estava nas ruas de Frei Paulo. Sua voz grave e inconfundível foi ouvida por muito tempo na rádio Princesa da Serra, no programa “Crepúsculo nordestino” líder de audiência na região.
Lili atravessava a praça e ao chegar à sua loja colocava uma preguiçosa na porta e passava o dia lendo jornal, Era o Jornal do Brasil, muito bem informado, mas não gostava de muita conversa. Sua loja vendia artigos interessantes, ferramentas para pedreiros, gaitas e realejos, presentes etc. Difícil ver alguém comprar alguma coisa lá, mas a loja era muito organizada. Sua esposa Teta era uma excelente costureira e as filhas lindas Liliane, Nanan e Desirrê.
Seu Desinho também trabalhava no Fórum Flavio da Rosa Melo, um homem culto que gostava de mostrar aos mais jovens seus conhecimentos literários. Abordava estudantes na praça para declamar textos poéticos de Augusto dos Anjos. Discorria sobre as obras de José de Alencar. Homem de linguajar rebuscado, mas também muito brincalhão. Ele é o pai de Gilberto, Cucuta e Gilmar, e também de Cassinha e Geovania.
De outro lado da praça, a loja de roupas de D. América, ali um papo agradável com Tonho Silveira, também chamado de Tonho Perneta, irmão de América, ao lado a farmácia de Faroaldo e a bodega de Quebra Santo. Este era sisudo e vestia-se sempre de preto. Ganhou esse nome porque na juventude era muito curioso e uma vez quebrou um caixote da igreja. Do mesmo lado ficava também a padaria de Dedé. De lá, em sextos aromáticos, saiam deliciosos pães italianos. Tibúcio um “vendião de pão” gritava em tom melódico pelas ruas. “Oi o pão italiano quentinho quem vai querer, tá quentinho” Seu Euclídes entrava para mais um expediente na exatoria, também ali na Praça Capitão João Tavares.
A bodega de Zé Correia era um ponto de encontro de vários amigos, ficava na esquina da travessa que vai dar na praça da matriz. Com uma conversa agradável e muita simpatia Zé Correia ao longo de sua existência conquistou muitas amizades, por ser um sujeito atencioso, sorridente. Já a farmácia de Paulinho era um local onde predominava conversas de cunho político, era um reduto de oposicionistas onde não faltavam críticas aos arenistas.
Antes de se tornar uma sorveteria era o Bar de Natan, vendia refresco de maracujá, mangaba e goiaba, bolos e sanduíches de mortadela, ali sempre na porta com um palito de fósforo passeando pela boca Tonho de Julieta, diariamente ficava ali, ele era deficiente por conta de um acidente que quase lhe tirou a vida. Foi enquanto viajava sobre uma marinete e se chocou com um fio de alta tensão. E a vida da cidade transcorria sempre num clima de paz e tranqüilidade, Era com esses e outros tantos personagens que a cidade de Frei Paulo ganhou a fama de cidade pacata.

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