quarta-feira, 11 de abril de 2012

O Senhor dos Sapos


Saímos da igreja naquele domingo, todos impressionados com as duras palavras do padre João Lima. Naquele dia a pregação foi uma implacável lição na molecada. Ele chamou a atenção das mães e cobrou uma providência para as molecagens que imperavam na cidade. Sugeriu surras e castigos. Eu sai dali sem graça, como se sobre os meus ombros pesasse todo o opróbrio dos malfeitos da cidade. Ele estava muito chateado com atitudes de vândalos que estavam depredando o educandário, quebrando os filtros e sujando as paredes. Nunca gostei de fazer esse tipo de coisa, preferia mais as molecagens que não causassem prejuízos materiais. Pra falar a verdade eu gostava muito mais das xingas do que da traquinagem propriamente dita.
Sem graça li a carta de São Paulo aos Corintos e sai naquele dia para o recanto sacrossanto do meu laboratório de cientista louco. Fui ter com meus sapos guardados em caixas de sapato, os maiores já vistos na cidade. Houve um momento na missa que o padre discorreu sobre as sete pragas do Egito e entre elas, enfatizou a invasão dos gafanhotos. Pois não é que naquela mesma noite a cidade fora invadida por exércitos de grilos. Quando vi aquilo fiquei assustado, era uma noite de inverno e tudo parecia tão diferente. Nuvens de grilo se formavam no coreto, na porta da igreja na porta da prefeitura. Enfim onde quer que tenha uma luz acesa.
No dia seguinte libertei todos os meus sapos e estes foram ao Tanque de Beber, e em cópulas magistrais se multiplicaram aos milhares e imbuídos de uma honrosa missão por mim determinada. Até as poças ficaram coalhadas de batráquios. Como que obedecendo à ordem de rei, subiram a ladeira e iniciaram uma providencial limpeza na cidade. Somente os baratões eu pedi que os poupassem, pois sempre gostei deles e também, sapo nenhum consegue engolir um inseto daquela magnitude.
À noite reuni todo meu exercito na praça, como um déspota, puni os rebeldes, persegui e matei impiedosamente os desertores. Fui atingido por leite de sapo nos olhos, tentando fazer justiça com os próprios pés, ardeu muito, mas não fiquei cego. Mais um mito que caiu por terra. Determinei um ataque devastador aos grilos e eles me obedeceram devorando os insetos com suas hábeis linguas, ligeiras como labaredas de fogo. O resultado foi trabalho dobrado para Bizoca, ele encheu a carroça de cocô de sapo, Juca os recolheu e a vida da cidade graças a minha sapiência e heroísmo voltou ao normal.
No domingo seguinte voltei à igreja com o coração em paz, padre João me olhou com aquele olhar amoroso de sempre. Com aquele manhoso sorriso que só ele sabia dar, agradecido por eu ter salvado a cidade. Li a carta de São Paulo aos Efésios e depois sai com os amigos para planejar novas molecadas, afinal isso aqui é ou não é São Paulo Moleque? E que nuvem é aquela? É tanajura. “Cai cai tanajura na panela da gordura”

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