sexta-feira, 27 de abril de 2012

Dia de careta

“Cara de Gata, Cara de Gata” diz o animado refrão da marchinha carnavalesca , tocada no baile onde tantos risos e danças , talco e serpentina se misturavam nos confins da minha infância. O bar de Dário ficava lotado de foliões, bem em frente os casais flertando lá pelo coreto. De dia essa alegria que contagiava os freipaulistanos e visitantes. Chegava à noite, lá pelas 20 horas no melhor da noite, elas chegavam para meu desespero. Eu era uma criança medrosa que tremia nas bases quando me deparava com aquelas criaturas horripilantes , tenebrosas, chifrudas. Elas se comunicavam através de um ruído e aquele ruído era onomatopeicamente assim (phrriiinnn).“arrrrgh, arf, arf,uf, uuf. Fiuuuuuuuuu arrrgh, arf, arf, uf, uf, uf arrrrrrrrrrrrrhg! Uf!!” Chega ... As caretas para mim causavam um trauma. Eu me lembro quando certo dia sai do baile , e fui tenebrosamente assustado por uma delas. Olhos de fogo, cabeleira aloirada e eu ali imóvel , indefeso, vulnerável. Quantos anos faz isso? Depois eu mesmo virei uma careta, tão somente para superar esse medo. Mas toda vez que me vestia de careta, era desmascarado e humilhado. Olhavam pra mim e diziam olha quem é e já iam puxando a máscara, e tome-lhe safanão. Era uma grande humilhação. Costumavam fazer isso com caretas pequenas. Um dia me vesti diferente, como um verdadeiro capeta, vesti roupas pretas, pintei de piche a careta e fui para a rua com meu bando de caretas. Mudei até o caminhado e naquele dia assustei um monte de crianças. Senti-me de fato uma careta. O carnaval em Frei Paulo tinha essa tradição momesca que aos poucos foi sendo esquecida. Havia bandos enormes de caretas no carnaval de minha terra. Os grupos se reuniam na rua do monturo e eram muitos, Mechó, Penacho , Canguçu, Beto de Joaninha, Seu Moleza, Espigão, Bufa, Nanão, Mú, Cara Véia entre vários outros. As mães advertiam “vá dormir cedo menino, hoje é dia de careta” E as caretas faziam um espetáculo que antecedia o show da orquestra comandada pelos membros da Filarmônica. O Grêmio Sesquicentenário era tomado pelas lindas colombinas e aqueles beberrões a abrir alas no salão de baile. E haja talco e serpentina, de confete o chão virava tapete. (Segundo alguns estudiosos, a origem da festividade não faz parte do período carnavalesco, mas do Natal, quando dois Mateus de um reisado se embriagaram durante a apresentação e foram proibidos de participar da manifestação. Inconformados, eles vagaram fantasiados pelo município, fazendo barulho com um chocalho e inaugurando a brincadeira.) Mas o carnaval de hoje é bem diferente assim como foi diferente num passado ainda mais remoto e será bem diferente no futuro, afinal carnaval é sempre a mesma coisa só mudam as caretas. Zé Matos e Pedro de Elpídeo mandavam ver no trombone e a bateria impecável dos filhos de Elizeu, faziam do nosso carnaval em uma pequena cidade de interior , uma festa de pompa. Eram quatro dias de muita animação e brincadeiras insondáveis. Hoje quando vejo nosso carnaval, me dá vontade de chorar de tristeza, não que seja saudosista, sempre carnaval pra mim foi sinônimo do escárnio humano, mas essa alegria não me convence, acho definitivamente que envelheci, ou virei careta.

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