segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

O bar de Zé Pequeno


Na verdade, o conceito de bar, supõe-se um local onde se pode tomar uma bebida. No bar de Zé Pequeno, não vendia cerveja nem cachaça, mas era um ponto que reunia um grupo grande de pessoas, todo por conta das mesas de sinuca e bilhar que eram as melhores de Frei Paulo. As tacadas rolavam de cedinho até altas horas. Quando Zé Pequeno queria tomar um trago, atravessava a rua, ia ao bar de Zé Totonho e enchia uma lata de óleo salada usada a guisa de copo. Zé Pequeno era um sujeito alegre, muito brincalhão, sorridente, mas quem passasse dos limites no interior do seu estabelecimento provava a sua austeridade que era impressionante. Ele detestava quem não sabia perder e exaltado batia com o taco nas mesas ou coisas do gênero. Quando alguém fazia isso, ou entrava sem camisa no bar, ele surgia do nada e aplicava um corretivo no folgado. Casado com D. Vanda era patriarca de uma prole numerosa: Garrincha,Muel, Lete,Sergio, Celso,Tarzan,Fael,Cuxita e Denal.
Era prazeroso o ver narrando suas aventuras, eram tantas histórias, que prendia a atenção de uma fiel platéia. Possuía um ciclo amplo de amizades em Frei Paulo, e também de ilustres visitantes. Um cara antológico, autêntico, não estava nem ai para agradar ninguém. “É hora de tirar o barato” chegava ele no meio das disputas. A principal mesa de sinuca do bar era profissional, nela assistíamos exímios jogadores mostrar suas habilidades no taco. Os filhos de Zé Pequeno, criados no meio do jogo, desenvolveram técnicas de sinuca apuradas. O mais velho, Garrincha, era simplesmente imbatível, quem o desafiava amargava a derrota.
Zé pequeno amava o jogo e as cartas. Num local reservado, no fundo do grande salão dos bilhares, o carteado atraía diversos jogadores, alguns até ilustres. Zé Pequeno, sempre sério na hora do jogo, fiscalizava as partidas, tirava barato, mas também expulsava sem cerimônia quem se atrevesse a dar palpite. Peru com ele não tinha vez, todos sabiam disso e por isso o respeitavam.
Outra grande paixão de Zé Pequeno era a criação de pássaros, e também galo de raça, ele atravessava a praça vindo de sua casa, com um galo debaixo do braço, com a mesma naturalidade que um executivo carrega sua maleta.
Ele criava passarinhos, mas os dele, nem sempre eram engaiolados, ele possuía uma habilidade ímpar como adestrador. Certa feita andava as voltas com um Sofrê, que começou a criar desde pequenininho. Nas manhãs quando eu ia cedinho para o Educandário, passava em frente ao bar e observava Zé Pequeno com um palito de picolé alimentando com papa o filhote de Sofrê. Colocou nele o nome de Bevenuto. O pássaro era criado solto e onde Zé Pequeno ia bastava assoviar que ele saia de onde estivesse e pousava no seu ombro. Onde está a chave? Perguntava ele ao passarinho. O bicho pegava um paliteiro plástico com o bico, abria a tampa, tirava o que tinha dentro: um paninho e outras quinquilharias e pegava a chave e dava ao seu dono.
Todos ficavam impressionados com a paciência que tinha com os bichos e de como conseguia adestrar para fazer artes, contando assim, parece até mentira. Certo dia, um visitante, desses cheios da grana, viu as habilidades de Bevenuto e ofereceu uma grande soma de dinheiro pelo pássaro. Zé Pequeno também demonstrava desapego e vendeu o passarinho. Poucos dias depois, lá estava ele com outro filhote de sofrê, alimentando com papa no palitinho, mas nenhum outro fazia as peripécias do tal Bevenuto, levado para outra cidade pelo rico visitante.
Zé Pequeno, colocava na porta do estabelecimento longos bancos de madeira onde um grupo se sentava para contar estórias. Ele também participava. Às vezes, a procissão estava passando e ele lavando os pés numa bacia, um ritual que não combinava. Muitas beatas torciam o nariz ao ver a cena, e ele cantando uma canção meio obcena, não tava nem ai. Já com idade avançada, era forte, mas os problemas de visão se agravaram, mas nem por isso perdia o bom humor e um largo sorriso que era sua marca registrada.

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