quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O professor Tupinambá da Bahia


Na minha infância de menino travesso no sertão sergipano, convivi com figuras que muito bem poderiam povoar as páginas dos romances de Gabriel Garcia Marques. Eram tipos inesquecíveis . Meu pai era dono da Farmácia São Paulo lá em Frei Paulo. E ali ao meu lado, arrumava as caixas de remédio que o representante acabara de trazer, quando entrou na farmácia um sujeito esquisito , cabelão, bigodão, olhos remelentos e indormidos.
-Um envelope de Engov por favor. Seu Bastos se dirigiu ao Balcão e de dentro tirou o pedido do tal forasteiro e o entregou.
Ele imediatamente começou a amassar o envelope transformando-o numa bolinha enquanto com olhar fixo pronunciou:
-O Sr. tem condições nacionais e internacionais de me confiar esse remédio. Seu Bastos com aquela fúria no olhar arrebatou de suas mãos os comprimidos e deu um rotundo não.
O homem sem camisa aparentando ter lá seus 60 anos seguiu em direção a pensão de D. Zefa, aquele caminhado desengolçado cruzou a praça Capitão João Tavares. Achei ele engraçado e sai atras dele. Na hora apareceu outro colega e seguimos o curioso estranho.
Dirigiu-se a nós de forma amável e cortez e nos convidou para um passeio em seu carro. Assim que sentamos no banco trazeiro ele arrastou com seu opala velho em alta velocidade na direção do Curral do Açougue, não parava de desferir tapas e mais tapas. (foram momentos de muito medo) Nós choravamos e gritavamos e ele se deliciava com a situação. Que sujeito mais esquisito. Por sorte, o carro faltou gasolina e ele foi lá mexer no motor. Já estavamos próximo à ponte do Salgado . Eu e meu colega escapamos e voltamos à toda para a cidade.
Isso aconteceu numa sexta-feira e sábado pela manhã no meio da feira lá estava ele cercado de gente incalta. Pregava ele com seu olhar fixo, como os profetas do velho testamento. "Eu sou o Professor Tupinambá da Bahia, passei duzentos anos na mata virgem comendo planta e raiz de pau". Pronunciava com profunda convicção.
O cara era um celerado , um louco e não faltava quem se dispusesse a uma consulta onde ele arrancava cada centavo dos pobres sertanejos, mediante mentiras criadas na hora para cada situação. Hora dizia que a vítima estava sendo traido pela mulher. Por outra era o irmão que estava querendo lhe passar a perna na herança. O professor era um picareta de marca maior um salafrário ladrão que tinha como profissão engabelar os coitados que caiam no seu conto. Diz ele, a um agresteiro: não faça feira não para aquela infeliz, dê esse dinheirinho ao Prof. Tupinambá que tudo vai ficar bem na sua vida. E num canto, se contorcia, fazia presepadas com as mãos e orações que pelo jeito deviam até xingar a Deus.
Esse famigerado Professor Tupinambá vivia pelas feiras do Nordeste enganando a um e a outro na sua vida de charlatanismo profissional. Talvez por isso, tinha a triste sina de ser um beberrão contumaz. Assim que acabava de atender um cliente aquele pobre diabo ia direto para a vendinha e entornava um copo de cachaça.Tinha na face como que escrito que era um vigarista, mas mesmo assim alguém caia no enrredo de sua tramóia. No pescoço trazia vários colares do candomblé. Cabelos em desalinho , barba por fazer. Um bigode que ele cuidadosamente enrroscava nas pontas. Era branco, um corpanzil corcundo, barrigudo. Sua voz lembrava o ronco de trovão, seu olhar tinha a constante sensação de desespero.
Domingo logo cedo , do alto falante da Matriz ouvia-se a voz do Pe Zezinho cantando " Estou pensando em Deus' quando aquela criatura diabólica desta vez com uma nota de dez na mão, dirigiu-se a meu pai que abria a farmácia.
-O Sr tem condições de ... A você nem por um milhão, respondeu Seu Bastos, de cara amarrada!

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